O Escotismo é, reconhecidamente, um Movimento que favorece e potencia o desenvolvimento integral da juventude. O impacto que tem, em praticamente todo o mundo, faz deste maravilhoso Movimento um dos mais procurados para que os jovens possam crescer saudável e harmoniosamente, tornando-se mais aptos construtores de um mundo novo, artífices da paz e promotores da justiça.
Para que este extraordinário método pedagógico seja implementado, Baden-Powell, o seu Fundador, deixou inúmeras pistas que, quando cuidadosa e atentamente seguidas, conduzem a uma vida de felicidade na dedicação e entrega aos outros.
Ora, se o Escotismo visa o desenvolvimento integral da juventude, ele diz respeito a tudo o que constitui a pessoa humana, nas suas diferentes dimensões que, sem excluir outras sínteses, podem ser agrupadas em: física; social; intelectual, afetiva; espiritual; e de caráter. Todas são importantes e complementares, na fidelidade ao legado do Fundador, que lhes dedicou especial atenção.
Provavelmente devido à sua natureza, a dimensão espiritual é uma das que maiores questões levantou ao longo da história do Escotismo. De tal forma as dúvidas surgiam logo de início que B.-P., questionado sobre a importância da dimensão religiosa no escutismo – portanto, não apenas espiritual, em sentido genérico, mas traduzida em vivências religiosas concretas – responde, referindo-se ao Escotismo: «não há qualquer lado religioso no Movimento; ele é todo baseado na religião»[1].
Que religião?… Apesar da sua vivência pessoal cristã, no seio da Comunhão Anglicana, para Baden-Powell isso não é relevante, desde que tenha uma concretização específica pois, como afirma: «Todos os escoteiros devem pertencer a uma confissão religiosa e tomar parte no respectivo culto»[2].
O Fundador não pretende equiparar «Escotismo» a «Religião». Quer, antes, deixar vincado de forma inequívoca que a dimensão espiritual, abraçada numa confissão religiosa, contribui de forma inalienável para o desenvolvimento integral da pessoa, visado pelo Escotismo. Na fidelidade aos princípios de Baden-Powell é pois, não só possível mas, desejável, propor o desafio do Escotismo em harmonia com a religião de cada escoteiro, permitindo assim que a dedicação ao próximo seja iluminada e fortalecida pela inspiração religiosa de todos os homens e mulheres e boa vontade.
Assim e, sendo um dos pilares do método escoteiro é a «pedagogia do exemplo», revela-se muito oportuna e desejável a presença de adultos que, vivendo a fé num determinado credo de forma feliz e convincente e, tendo formação adequada para ajudar os jovens de uma determinada religião no caminho espiritual proposto por essa, possam ser verdadeiros «irmãos mais velhos» desses escoteiros. É o caso, não exclusivo, dos Capelães Escoteiros.
Nem só os Capelães têm a missão de dar testemunho de vivência religiosa, mas todos os adultos que servem no Escotismo. Desse facto resulta, pois, que a missão de um Capelão no Escotismo se destine a apoiar, não só os Escoteiros, mas também os seus Dirigentes adultos, para que estes desempenhem de forma eficaz a missão global que lhes é confiada.
Em associações pluri-confessionais, o papel dos Capelães deve sempre permitir equidade de oportunidades às diferentes Confissões, sem ser nunca proselitista mas, também, sem deixar de viver de forma natural a dimensão religiosa, explícita e implicitamente, ainda que possa surgir o pretexto de essa não ser partilhada por todos. Em questões religiosas a neutralidade não existe e, abdicar de uma prática religiosa é promover o ateísmo ou o agnosticismo… Convém lembrar que os deveres para com Deus («Duty to God») constam da promessa escoteira original e devem, por isso, ser efetivamente respeitados. Se todos promoverem a vivência religiosa no Escotismo, ver-se-á surgir certamente, um fortalecimento dos laços ecuménicos bem como do diálogo inter-religioso, contribuindo assim para deixarmos o mundo (pelo menos) um pouco melhor do que o encontrámos: este mesmo mundo, não outro diferente…
[1] R. BADEN-POWELL, O Rasto do Fundador, Edição Portuguesa do Corpo Nacional de Escutas,153.
[2] R. BADEN-POWELL, Aids to Scoutmastership, 92.
RUI JORGE SILVA é Padre Católico Romano, Pároco do Carregado, Portugal. Foi Capelão Nacional do CNE – Corpo Nacional de Escutas, Escotismo Católico Português e Capelão Europeu da Conferência Internacional Católica de Escotismo (CICE) onde participou de diversos eventos internacionais na função do exercício da capelania escoteira, incluindo na JMJ-Rio-2013, no Rio de Janeiro, e na Conferência Mundial Escoteira em 2010, em Curitiba.
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