Mestre.
Forte palavra. Inclusive, um pouco a mais que a habitual usada nos grupos escoteiros: “Chefe”. Sim, mesmo “Chefe escoteiro” ainda soa forte… Mas olhem o desafio de carregar o título de “Mestre pioneiro” no mínimo ousado. Remete a algo como: “Mestre do Universo”, aquele que está acima das montanhas, acima da razão, acima dos valores, acima do todo…Esse é o mestre, um exemplo a ser seguido por todos, afinal de contas ele é o mestre naquilo que se predispôs. Mas será que é isso mesmo? É essa a figura inatingível que deve emular o educador-escoteiro dedicado ao desenvolvimento dos jovens de 18 a 21 anos?
Na minha pequena vida, tive a oportunidade de ser “Mestre” desde os 12 anos. Calma que explico. A primeira vez que me vi com tal foi como “Mestre Jedi”. Amo Star Wars, e ali tive contato meu primeiro referencial de mestre, na pele do astuto eremita Obi Wan Kenobi, em cena através monstro Alec Guinness. Como aquilo me fascinou. As roupas, o jeito calmo de falar, de conduzir os conflitos, de guiar um jovem sonhador para um caminho bom, um caminho de luz, de justiça, contra a tirania de um Império esmagador. Eu rapidamente me intitulei “Mestre Jedi”. Queria ser aquele cara! Obi Wan virou meu personagem predileto da Saga, e a figura do Mestre ficou gravada em mim pela primeira vez, sendo reforçada mais tarde por outros tantos personagens daquela galáxia muito distante e ao mesmo tempo tão próxima da nossa realidade.
Não demorou muito para que eu me tornasse “Mestre” em um outro segmento. Aos 16 anos virei “Mestre de R.P.G”. Calma que explico também. Role Playing Game, é uma modalidade de jogo de interpretação popular nos anos 80/90. No bom português, é bem parecido com aquelas brincadeiras que fazíamos quando crianças o “Polícia e ladrão”, na qual imaginávamos ser os policiais mais destemidos ou os bandidos mais perversos, e com armas formadas de dedos polegares e indicadores, disparávamos nossos tiros de vento e muita criatividade. Tudo uma loucura deliciosamente fantasiosa, bem como no R.P.G, que tem na figura do mestre, o responsável por contar a história e organizar as regras do jogo. Seria como se no “Policia e ladrão” existisse alguém que diria: “João o tiro do Frank acabou de pegar em você em cheio e está uma hemorragia enorme! O que você fará?” Narrei história enormes – Quase seriados de mais de 5 anos de duração – sobre vampiros, caçadas, aventuras e desventuras, tudo regado a muita fantasia. Minha histórias estimulavam meu grupo de amigos a continuarem juntos num propósito, que numa semana se resumia a dominar uma masmorra, e no outro crescia para uma festa. Ser mestre de R.P.G me ensinou muitas coisas.
Quando chego aos 23 anos, minha vida encontra meu terceiro título de “mestre”: O “Mestre Pioneiro”. Desse tipo de mestre, acredito que todos aqui conheçam bem. Mas sim, eu fui um “Mestre” bem cedo. Quase um mestre noviço, porém não havia como ser diferente, eu tive o chamado para a aventura…Se não fosse mestre um clã todo seria perdido, e meus amigos não teriam uma boa vivência no Ramo Pioneiro. Decidi que teria de fazer essa missão, mas vi que não estava pronto para tal. A verdade é nunca estamos. Mas o nome “mestre” nos empodera de uma forma que todos acreditam que estamos. E que nível de maturação seria esse para sermos considerados prontos, bons ou perfeitos? Minha busca foi a de fazer com que tudo tivesse sentido, procurando o máximo de referências. Logicamente fui um pouco mestre jedi e mestre de R.P.G nos meus primeiros anos, mas o que mais me ensinou foi olhar para aqueles que faziam isso há mais tempo. Uma querida Mestre Cida me ensinou o amor que devemos ter por cada um dos pioneiros; um focado mestre Paulo me mostrou do quanto precisamos do equilíbrio para caminhar e um saudoso Mestre Zequinha me deixou a missão do quanto devemos ser devotados aos objetivos desses jovens, que passam a ser os nossos também. No fundo se eles estiverem bem, nós também estaremos.
Ser mestre pioneiro é uma das experiências mais engrandecedoras que o movimento escoteiro pode te dar. Com muita humildade, você tem a permissão de entrar na vida de alguém e ajuda-la para onde ela quer ir, que caminhos tomar, como agir ás mais diversas situações. Muito mais do que os modernos “coachings” ou “mentorings” da vida, mas algo verdadeiro que atravessa e preenche a vida de alguém para sempre: Um amigo. Aquele que jamais nos esquecemos, um amigo que nos permite caminhar e fazer com que outros caminhem. Um amigo que nos permite errar e nos mostra o quanto crescemos nestas intempéries. É bem verdade que não é uma tarefa fácil, mas o que dizer de algo tão genuíno, tão verdadeiro? Os cursos, a vivência, os pioneiros, vão ensinar muito, mas não existe um bom mestre pioneiro, que não se entregue totalmente. Ser mestre é isso, é ser mais do que um educador clássico, é ser alguém que pela dedicação e o carinho pelo que faz, consegue dar luz para que esses jovens brilhem.
E como eles brilham. O mestre é também como aquele pai, que está criando seus filhos de maneira muito próxima, mas focado na preparação em encarar um mundo de desafios. Assim como Obi Wan treinou Luke Skywalker para vencer Darth Vader, assim como o mestre de RPG prepara os jogadores para lutar com o próximo Dragão. O mestre Pioneiro prepara os pioneiros para vencerem um mundo desafiador, que está fora do grupo escoteiro. Quando eles terminam essa jornada, estão prontos para irem e dominarem esse tal mundo, que acabam por constatar que não é tão assustador assim. Tenho orgulho das quatro gerações que tive prazer de orientar como mestre pioneiro. Alguns deles voltam, mas a maioria encontra seu lugar no mundo. Bate sempre uma saudade, das histórias, dos desafios e dos medos que tinham. Nesse momento sempre corro para a rede social e pergunto como estão, e fico feliz em saber que continuam caminhando em suas vidas. Esse é o mestre. Aquele que está sempre pronto para preparar os próximos, independente da circunstância; Que aprende sempre, porém, aquele que se estabelece de uma maneira que nunca poderá ser esquecida…O mestre se torna um eterno amigo…Um Bom amigo…Para toda a vida!
LEONARDO MANDU é Diretor e Mestre Pioneiro do 26ºGrupo Escoteiro Jardins de Santo Antonio (RJ) e Coordenador de Recursos Humanos da empresa ATENTO.